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Clama agora por ajuda, para ver se alguém te responde!
Para qual dos santos te voltarás?
Porque a ira destrói o insensato
e a inveja mata o tolo.
Já vi o insensato estabelecer raízes
e ser temporariamente bem sucedido;
contudo, de repente toda a sua casa foi amaldiçoada.
Os seus filhos são defraudados
sem que haja alguém que os defenda.
As suas propriedades são pilhadas e as riquezas que têm
servem para satisfazer a ganância de muitos outros,
mas não deles próprios!
A aflição abate-se sobre eles para os castigar,
por terem semeado sementes de pecado.
A humanidade nasce para a miséria,
tal como as chamas se erguem do fogo para o ar.

Se fosse eu, buscaria mais a Deus,
e lhe entregaria o meu problema.
Porque ele faz coisas maravilhosas,
milagres sem conta.
10 Manda a chuva sobre a terra para a regar.
11 Dá prosperidade ao pobre e ao humilde
e põe os que sofrem em lugar seguro.
12 Contraria os planos dos ardilosos,
de modo que as suas mãos nada possam executar.
13 Apanha os sábios na sua própria astúcia
e os seus esquemas caem por terra.
14 Por isso, andam tateando como cegos em plena luz;
nem por ser de dia veem melhor do que de noite.
15 Deus protege os órfãos das garras desses opressores.
16 Assim, finalmente, os que vivem mal têm esperança;
mas os malvados têm de calar a sua boca.

17 Feliz é aquele a quem Deus corrige!
Oh! Não desprezes a correção do Todo-Poderoso!
18 Porque ainda que fira, ele mesmo trata e cura.
19 Livrar-te-á, sempre que for preciso,
de forma que o mal não te afetará definitivamente.
20 Guardar-te-á da morte e da fome
e do poder das armas, em tempo da guerra.
21 Estarás protegido do maldizente;
não terás de recear quando vier a desgraça.
22 Rir-te-ás na guerra e na fome;
os animais selvagens não te meterão mais medo;
todos os animais perigosos se reconciliarão contigo.
23 Pois farás aliança até com as pedras do campo
e os animais da terra conviverão em paz contigo.
24 Verás que a tua casa está em segurança;
quando tiveres de te ausentar, para visitar o teu rebanho,
contarás os teus bens e concluirás que nada te falta.
25 A tua descendência se multiplicará;
os teus filhos serão tão numerosos como a erva.
26 Terás uma vida longa e boa;
serás como os cereais que só se recolhem
quando chega exatamente o tempo devido.

27 A experiência tem-me mostrado que tudo isto é verdade;
por isso, para teu próprio bem, ouve o meu conselho!”

Job

Resposta de Job:

“Oh! Se a minha tristeza e a minha mágoa se pudessem pesar!
São mais pesadas do que a areia de milhares de praias;
por isso, falei inconsideradamente.
Porque o Todo-Poderoso me atingiu com as suas flechas;
as suas setas envenenadas penetraram fundo no meu coração.
Todos os terrores vindos de Deus se abateram sobre mim.
Quando os jumentos monteses zurram
é porque se lhes acabou a erva verde;
o boi não se põe a mugir de fome se está junto ao pasto.
Geralmente uma pessoa queixa-se,
se lhe faltar o tempero na comida.
Terá algum gosto a clara do ovo crua?
Perco mesmo o apetite só de ver;
fico doente ao pensar que teria de a engolir!

Oh! Se Deus me concedesse aquilo que mais anseio!
Morrer debaixo da sua mão
e ficar livre do seu aperto que me magoa.
10 Uma coisa me dá consolação, apesar de todo o sofrimento:
é que não neguei as palavras do Deus Santo.

11 Porque é que a minha própria resistência me mantém vivo?
Como posso ter paciência para ficar à espera de morrer?
12 Porventura tenho a resistência da pedra?
É meu o corpo de bronze?
13 Estou completamente desamparado;
o sucesso está fora do meu alcance.

14 Normalmente é-se misericordioso com um amigo enfraquecido,
a menos que se tenha afastado do temor do Todo-Poderoso!
15 Meus irmãos, vocês mostraram-se menos consequentes
que um ribeiro que transborda no vale.
16 Corre cheio quando neva e chega o degelo.
17 Mas quando o tempo aquece, ele baixa;
com o calor, desaparece completamente.
18 Os viajantes procuram-no para se refrescarem,
mas não encontram nada no seu leito e perecem.
19 Os que vêm de Tema e de Sabá detêm-se,
para ali se abastecerem de água.
20 Mas ficam dececionados, ao chegarem;
sentem-se envergonhados, por terem confiado.
21 Assim acontece comigo: estou desiludido;
vocês afastam-se de mim cheios de medo e recusam-me ajuda.
22 Mas porquê, afinal?
Já vos pedi alguma vez a mais pequena coisa?
Alguma vez vos roguei que me oferecessem um presente?
23 Pedi que me libertassem do inimigo
ou me resgatassem dos opressores?

24 Tudo o que pretendo é uma resposta adequada
e então ficarei sossegado.
Digam-me o que é que eu fiz de errado?
25 Como são duras as palavras justas e verdadeiras!
Contudo, a vossa crítica não se baseia em factos.
26 Querem porventura reprovar as minhas palavras
e tratar como vento as palavras dum homem desesperado?
27 Isso seria bater num órfão desamparado
ou vender um amigo.

28 Olhem para mim: Mentir-vos-ia eu?
29 Parem de me considerar culpado, porque sou uma pessoa reta.
Não sejam tão injustos!
30 Não conheço eu bem a diferença entre o bem e o mal?
Não saberia aceitar, se tivesse realmente pecado em alguma coisa?

A humanidade é obrigada a lutar.
A vida duma pessoa é longa e dura;
os seus dias são semelhantes aos dum assalariado.
É como um escravo que suspira pela sombra, pelo fim do dia;
como um assalariado, que suspira pelo seu salário.
A mim também me deram meses de frustração,
com longas e pesadas noites.
Quando vou para a cama penso:
‘Oh! Se fosse já de manhã!’
E assim me agito até que o Sol nasce.
Tenho a pele cheia de vermes e de terra;
A minha carne abre-se com chagas, cheias de pus.

Os meus dias passam mais rápido
que a lançadeira do tecelão que não para;
um segue-se ao outro sem esperança alguma.
Lembra-te de que a minha vida é como o vento que passa sem deixar rasto;
nada fica de bom.
Estão a ver-me, neste momento,
mas não será por muito mais tempo;
em breve estarão a ver apenas um morto.
Da mesma forma que a nuvem se desfaz e desaparece,
assim os que descem ao mundo dos mortos[a], se vão para sempre.
10 Vão-se para sempre das suas famílias, dos seus lares;
nunca mais serão vistos.

11 Ah! Deixa-me expressar a minha angústia!
Quero sentir-me livre para dizer
toda a amargura que me vai na alma.
12 Ó Deus, serei eu o mar ou algum grande animal marinho,
para que ponhas um guarda sempre a meu lado?
13 Tento esquecer a minha miséria no sono.
14 Mas tu horrorizas-me com pesadelos.
15 Preferia antes morrer estrangulado,
a continuar a viver sempre assim.
16 Desprezo a minha vida;
não quero viver para sempre!
Deixa-me sozinho,
pois os meus dias não têm sentido.

17 Que vale um simples homem,
para que lhe dês tanta atenção?
18 Será obrigatório que sejas o seu inquisidor logo de manhã
e fiques a experimentá-lo cada momento do dia?
19 Porque não me deixas só,
nem mesmo o tempo de engolir a saliva?
20 Feriu-te o meu pecado, ó meu Deus, guarda da humanidade?
Por que razão fizeste de mim o teu alvo preferido,
tornando-me a vida num pesado fardo?
21 Porque não perdoas, enfim, o meu pecado
e não o atiras para longe?
Porque em breve jazerei debaixo da terra, morto;
quando forem à minha procura, já terei desaparecido.”

Footnotes

  1. 7.9 No hebraico, Sheol, é traduzido, ao longo do livro, por mundo dos mortos. Segundo o pensamento hebraico do Antigo Testamento, é o lugar dos mortos, mas não necessariamente como um sepulcro ou sepultura, que é um lugar de morte e definhamento, mas sim um lugar de existência consciente, embora sombria e infeliz.

Elifaz exorta a Jó a que busque a Deus

Chama agora; há alguém que te responda? E para qual dos santos te virarás? Porque a ira destrói o louco; e o zelo mata o tolo. Bem vi eu o louco lançar raízes; mas logo amaldiçoei a sua habitação. Seus filhos estão longe da salvação; e são despedaçados às portas, e não há quem os livre. A sua messe a devora o faminto, que até dentre os espinhos a tira; e o salteador traga a sua fazenda. Porque do pó não procede a aflição, nem da terra brota o trabalho. Mas o homem nasce para o trabalho, como as faíscas das brasas se levantam para voar.

Mas quanto a mim eu buscaria a Deus, e a ele dirigiria a minha fala. Ele faz coisas tão grandiosas, que se não podem esquadrinhar; e tantas maravilhas que se não podem contar. 10 Ele dá a chuva sobre a terra e envia água sobre os campos, 11 para pôr os abatidos num lugar alto; e para que os enlutados se exaltem na salvação. 12 Ele aniquila as imaginações dos astutos, para que as suas mãos não possam levar coisa alguma a efeito. 13 Ele apanha os sábios na sua própria astúcia; e o conselho dos perversos se precipita. 14 Eles, de dia, encontram as trevas; e, ao meio-dia, andam como de noite, às apalpadelas. 15 Mas ao necessitado livra da espada da sua boca, e da mão do forte. 16 Assim, há esperança para o pobre; e a iniquidade tapa a sua própria boca.

17 Eis que bem-aventurado é o homem a quem Deus castiga; não desprezes, pois, o castigo do Todo-Poderoso. 18 Porque ele faz a chaga, e ele mesmo a liga; ele fere, e as suas mãos curam. 19 Em seis angústias, te livrará; e, na sétima, o mal te não tocará. 20 Na fome, te livrará da morte; e, na guerra, da violência da espada. 21 Do açoite da língua estarás abrigado; e não temerás a assolação, quando vier. 22 Da assolação e da fome te rirás; e os animais da terra não temerás. 23 Porque até com as pedras do campo terás a tua aliança; e os animais do campo estarão contigo. 24 E saberás que a tua tenda está em paz; e visitarás a tua habitação, e nada te faltará. 25 Também saberás que se multiplicará a tua semente, e a tua posteridade, como a erva da terra. 26 Na velhice virás à sepultura, como se recolhe o feixe de trigo a seu tempo.

27 Eis que isto já o havemos inquirido, e assim é; ouve-o e medita nisso para teu bem.

Jó justifica as suas queixas

Então, Jó respondeu e disse: Oh! Se a minha mágoa retamente se pesasse, e a minha miséria juntamente se pusesse numa balança! Porque, na verdade, mais pesada seria do que a areia dos mares; por isso é que as minhas palavras têm sido inconsideradas. Porque as flechas do Todo-Poderoso estão em mim, e o seu ardente veneno, o bebe o meu espírito; os terrores de Deus se armam contra mim. Porventura, zurrará o jumento montês junto à relva? Ou berrará o boi junto ao seu pasto? Ou comer-se-á sem sal o que é insípido? Ou haverá gosto na clara do ovo? A minha alma recusa tocar em vossas palavras, pois são como a minha comida fastienta.

Quem dera que se cumprisse o meu desejo, e que Deus me desse o que espero! E que Deus quisesse quebrantar-me, e soltasse a sua mão, e acabasse comigo! 10 Isto ainda seria a minha consolação e me refrigeraria no meu tormento, não me poupando ele; porque não repulsei as palavras do Santo. 11 Qual é a minha força, para que eu espere? Ou qual é o meu fim, para que prolongue a minha vida? 12 É, porventura, a minha força a força da pedra? Ou é de cobre a minha carne? 13 Está em mim a minha ajuda? Não me desamparou todo auxílio eficaz?

14 Ao que está aflito devia o amigo mostrar compaixão, ainda ao que deixasse o temor do Todo-Poderoso. 15 Meus irmãos aleivosamente me trataram; são como um ribeiro, como a torrente dos ribeiros que passam, 16 que estão encobertos com a geada, e neles se esconde a neve. 17 No tempo em que se derretem com o calor, se desfazem; e, em se aquentando, desaparecem do seu lugar. 18 Desviam-se as caravanas dos seus caminhos; sobem ao vácuo e perecem. 19 Os caminhantes de Temá os veem; os passageiros de Sabá olham para eles. 20 Foram envergonhados por terem confiado; e, chegando ali, se confundem. 21 Agora, sois semelhantes a eles; vistes o terror e temestes. 22 Disse-vos eu: dai-me ou oferecei-me da vossa fazenda presentes? 23 Ou: livrai-me das mãos do opressor? Ou: redimi-me das mãos dos tiranos?

24 Ensinai-me, e eu me calarei; e dai-me a entender em que errei. 25 Oh! Quão fortes são as palavras da boa razão! Mas que é o que censura a vossa arguição? 26 Porventura, buscareis palavras para me repreenderdes, visto que as razões do desesperado são como vento? 27 Mas, antes, lançais sortes sobre o órfão e especulais com o vosso amigo. 28 Agora, pois, se sois servidos, olhai para mim; e vede se minto em vossa presença. 29 Voltai, pois, não haja iniquidade; voltai, sim, que a minha causa é justa. 30 Há, porventura, iniquidade na minha língua? Ou não poderia o meu paladar dar a entender as minhas misérias?

Porventura, não tem o homem guerra sobre a terra? E não são os seus dias como os dias do jornaleiro? Como o cervo que suspira pela sombra, e como o jornaleiro que espera pela sua paga, assim me deram por herança meses de vaidade, e noites de trabalho me prepararam. Deitando-me a dormir, então, digo: quando me levantarei? Mas comprida é a noite, e farto-me de me voltar na cama até à alva. A minha carne se tem vestido de bichos e de torrões de pó; a minha pele está gretada e se fez abominável. Os meus dias são mais velozes do que a lançadeira do tecelão e perecem sem esperança. Lembra-te de que a minha vida é como o vento; os meus olhos não tornarão a ver o bem. Os olhos dos que agora me veem não me verão mais; os teus olhos estarão sobre mim, mas não serei mais. Tal como a nuvem se desfaz e passa, aquele que desce à sepultura nunca tornará a subir. 10 Nunca mais tornará à sua casa, nem o seu lugar jamais o conhecerá.

11 Por isso, não reprimirei a minha boca; falarei na angústia do meu espírito; queixar-me-ei na amargura da minha alma. 12 Sou eu, porventura, o mar, ou a baleia, para que me ponhas uma guarda? 13 Dizendo eu: Consolar-me-á a minha cama, meu leito aliviará a minha ânsia! 14 Então, me espantas com sonhos e com visões me assombras; 15 pelo que a minha alma escolheria, antes, a estrangulação; e, antes, a morte do que estes meus ossos. 16 A minha vida abomino, pois não viverei para sempre; retira-te de mim, pois vaidade são os meus dias. 17 Que é o homem, para que tanto o estimes, e ponhas sobre ele o teu coração, 18 e cada manhã o visites, e cada momento o proves? 19 Até quando me não deixarás, nem me largarás, até que engula a minha saliva? 20 Se pequei, que te farei, ó Guarda dos homens? Por que fizeste de mim um alvo para ti, para que a mim mesmo me seja pesado? 21 E por que me não perdoas a minha transgressão, e não tiras a minha iniquidade? Pois agora me deitarei no pó, e de madrugada me buscarás, e não estarei lá.